1.3.08

carta para um amigo

Caio, são vinte e três e vinte de um sábado chuvoso.
Saturno, nosso tão tenebroso Saturno me trouxe para terras mineiras.
Aqui é tudo muito lindo!
A cidade foi desenhada de maneira que deixa doido todo e qualquer transeunte com um mapa na mão. Há uns triângulos desnecessários no meio das ruas; os transportes coletivos possuem numerações parecidas, o que já me fez cruzar um bairro e outro em cima de um all star. Mas há beleza em toda esquina, em todo ladrilho e árvores soltas no meio da vida urbana.
Meus pensamentos, saudades e desejos sobem ladeiras, numa falta de fôlego que dá taquicardia, não sei se de ociosidade ou de emoção de ver a cidade sempre de um alto.
Quando a noite chega faz lembrar dezembro. Belo Horizonte parece que vive um Natal constante em todas as noites; as casas iluminadas brilham de longe, deixando o peito da gente apertado de tanta boniteza.
Tenho me inspirado em você, na sua ida à Londres, Berlim, Paris...
Abdiquei de um mundo, de uma Fortaleza imensa em mim, pra deixar que esse Horizonte se expanda nesse um metro e meio. Mudei de vida, de endereço, luxos e pernas pro ar.
Subo ladeiras, caminho vinte e quatro horas por dia em busca de emprego.
É Caio, o novo assusta!
Temo a cada passo, mas cada passo me mostra um novo instante, um recomeço, uns breus que clareiam; a simplicidade deixa a gente mais humilde, mais humano, mais maduro.
Vez ou outra me sinto deslocada, mas respiro fundo e deixo que as energias me guiem, assim como você; nessas horas me prendo às crenças, à proteção das turmalinas negras e as boas transformações das ametistas, carrego uma pendurada num cordão feito por mãos acreanas, bem dizer no meio do peito, pra equilibrar o tum tum tum, e de repente tudo se clareia diante dos meus olhos.
Quase sinto você pertinho sussurrando no meu ouvido:
“Tão longe ficou o tempo, esse, e pensarás, no tempo, naquele, e sentirás uma vontade absurda de tomar atitudes como voltar para a casa de teus avós ou teus pais ou tomar um trem para um lugar desconhecido ou telefonar para um número qualquer (e contar, contar, contar) ou escrever uma carta tão desesperada que alguém se compadeça de ti e corra a te socorrer com chás e bolos, ajeitando as cobertas à tua volta e limpando o suor frio de tua testa.
Já não é tempo de desesperos. Refreias quase seguro as vontades impossíveis. Depois repetes, muitas vezes, como quem masca, ruminas uma frase escrita faz algum tempo. Qualquer coisa assim:
- ... mastiga a ameixa frouxa. Mastiga, mastiga, mastiga: inventa o gosto insípido na boca seca...”


E... é mais ou menos assim quando temo; fecho os olhos e crio novos gostos, cheiros e fotografias.
E cada descida de cada ladeira me faz querer subir outra e outra e outra, porque sempre acho que lá no alto é que mora a tal felicidade

e bem sei que é verdade!

Meu amigo, te beijo carinhosamente. Luana.

dá o play

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