24.5.06



O sol demora a se pôr de lá de cima.
Talvez porque o lá em cima parece não acabar nunca e tudo tem tamanho de caixinha de fósforo.
Carreguei dez pessoas dentro do peito; cada uma com sobrenome saudade.
Até que chegamos em São Paulo, eu e ele.
E São Paulo é grande mesmo quando vista de lá de cima. Uma cidade cinza, um facho de luz cruzando os prédios...
O MAM; o MASP; Pinacoteca; Estação da Luz; a Sé; Ibirapuera; 25 de Março, Vila Mariana...
Tudo é lindo!
Cidade para ser fotografada com o diafragma dos olhos, a cada passo, e eu definitivamente não sei descrever todas as imagens.
Então, peço licença ao Zeni e uso aqui suas aspas:

"É sempre noite no metrô, mesmo quando se desce pelas escadas rolantes com uma música na cabeça, que é como continuar a rolar no embalo do som, caminhando, ritmado, carregando o dia lá de fora. É sempre o mesmo breu e o mesmo efeito de imagens refletidas nos vidros, umas luzes que correm ao longe do túnel.
A música, boa música na cabeça e as pessoas que vão ficando menores na plataforma quando o trem acelera. Demora um pouco para se perceber que o escuro dura. Uns olhos que se fecham lentamente: ela pousa as pálpebras no lugar e volta a abrir os olhos e faz assim algumas vezes com um sorriso nos lábios pintados de vermelho.
A chegada do trem à estação. Bom quando o trem chega àquelas estações abertas, acima do chão.
Um pouco de ar, um pouco de luz. Dá pra ver a cidade (e a cidade se toca da existência do metrô).
O jogo de reflexos nos vidros da estação faz com que um poste de luz se encaixe no corpo de um homem. De pé, dentro do outro vagão. Seu corpo é poste e fiação, resistência e ligações clandestinas.
Os grandes cílios parecem que ondulam. O lápis no olho, a sandália no pé, as pernas cruzadas, a música: cruza e descruza as pernas e o sorriso está lá.
Tem uma bolsa no colo.
A cabeça se equilibra acima do poste: o homem no metrô, o poste lá embaixo na rua, unidos no vidro. O trem acelera dentro do túnel de novo.
Um grupo de garotas conversa sobre os meninos do cursinho. Os olhos de um velho de pernas cruzadas escorrem de visgo. O nervo, o vinco e o visgo. Desculpe incomodá-los, mas venho humildemente pedir uma ajuda, uma contribuição, que a situação não está fácil, são as crianças na escola e os velhos doentes...
As pessoas dormindo. Duas senhoras de pernas e pés inchados. Os office-boys e suas pastinhas. Os caras de terno. A música na cabeça. A escuridão do túnel. A música, que é um lance que faz pirar mesmo. Ficar no embalo da música. Que para quando o metrô chega na estação.
O barulho dos freios. As portas se abrem. Aquela gente toda saindo dos vagões.
Todos os sons (os que existem e os que não). A música volta e é como se ela tivesse só abaixado um pouco aqui dentro. As escadas rolantes - subindo, subindo, em velocidade constante - e de novo o dia, do lado de fora, que já dá para vê-lo surgir. A luz. Caminhando, ritmado. O som no máximo
".


e acho que as aspas explicam a minha preferência pela calmaria...

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